Spike é o mais novo vampiro com alma
do Buffyverse de Joss Whedon. Ele, por
livre e espontânea vontade, foi até a África e,
numa caverna escura onde um soturno demônio
espreitava, lutou e conseguiu ter sua alma
restaurada.
A verdade é
que Spike, ao contrário de Angelus, sempre
demonstrou ser um forte candidato para
ingressar no exclusivíssimo clube dos
"vampiros com alma" ou até mesmo se tornar
humano novamente — senão, vejamos:
No episódio
The I in Team, Giles fala para
um Spike ainda revoltado por ter sido
neutralizado que no fato dele ter sido chipado
pode haver uma razão maior:
Giles:
Pensando sobre seu problema e a sua
nova descoberta de que pode lutar
contra demônios, ocorreu para mim
que isto é completamente contra a
sua natureza. Ocorreu para você que
pode haver um objetivo maior-
Spike
o interrompe.
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Em Surprise,
o [Juiz], demônio que mata
qualquer ser com algum traço de humanidade,
percebe que Spike (e Drusilla), mesmo sendo um
vampiro, tem traços de humanidade dentro de
si:
Juiz:
Você!
Spike:
Ei, ei , ei. O que isto, colega?
Juiz:
Vocês dois fedem humanidade. Vocês
compartilham afeição e ciúmes. |
Em Innocence,
vemos o quanto Angelus é diferente de Spike,
quando o Juiz toca o vampiro:
O
Juiz coloca sua mão no peito de Angel:
Spike:
Isto dói, não é?
Angelus:
Bem, sabe, faz cócegas.
Spike:
Não fique parado aí, queime-o.
Angelus:
Ei, talvez ele não esteja
funcionando.
Spike:
Que diabos está acontecendo?
Juiz:
Este aqui... não pode ser
queimado. Ele está limpo.
Spike:
Limpo? Você quer dizer que ele
está...
Juiz:
Não há humanidade nele.
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Spike, após
ser chipado, passar a conviver com os Scoobies
e, depois que se apaixona por Buffy, quer ser um homem, e
sofre quando percebe que não é; ao contrário
de Angelus, que não perdoa Buffy por ela tê-lo
feito sentir-se humano:
-Innocence-
Angelus:
Ela (Buffy)
fez com que eu me sentisse
humano. Não é o
tipo de coisa que você possa
perdoar.
-The Gift-
Spike:
Eu sei que você nunca vai me amar.
Eu sei que sou um monstro. Mas você me
trata como um homem.
E isto...
-Smashed-
Spike:
Um homem
pode mudar.
Buffy:
Você não é um homem. Você é uma
coisa.
Spike:
Pare de fugir!
Buffy:
Não toque em mim!
-Seeing Red-
Spike:
Eu experimentei a vida de duas
Caça-Vampiros. Mas com Buffy...
não era para ser assim. É o chip.
Aço, fios e silicone. Não me deixa
ser um monstro. E eu não posso
ser um homem. Eu
não sou nada.
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Enquanto
Angelus foi amaldiçoado com uma alma (e odeia
isto), Spike, após tentar agredir Buffy, toma
uma decisão que mudará seu destino para
sempre: vai para a África lutar para ter sua
alma restaurada — para que Buffy tenha o que
merece.
Spike:
Dê-me o que eu quero. Faça-me o que
eu era, assim Buffy vai ter o que
merece.

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O
Caminho da Redenção
Nas
primeiras temporadas, Spike era um vampiro
cruel, como todos os outros. Deveria ter sido
estaqueado por Buffy, mas devido ao talento e
aos belos olhos azuis de James Marsters, não
foi.
Um dia, ele
é capturado pela Iniciativa e tem um chip
implantado em seu cérebro. Tal chip o
impede de ferir humanos, neutralizando-o como
vampiro. Spike então, se sentindo totalmente
indefeso, vai procurar sua arqui-inimiga Buffy
e os Scoobies e pede proteção a eles
em troca de alguns favores. Ele não quer
correr o risco de ser morto, pois gosta muito
do nosso mundo — de asas de galinha fritas, de
futebol, de cerveja e, principalmente, dos
"Lanchinhos Felizes Com Pernas". Spike
continua sendo um vampiro cruel e perigoso,
sem simpatia nenhuma pelos humanos que o
receberam ou por qualquer outro na face da
terra — ele apenas não pode mais se alimentar
diretamente de humanos.
Muito bem,
os Scoobies chegam a conclusão que ele
está realmente inofensivo e Spike vai morar
com Giles, inicialmente, e depois com Xander.
Ele passa a conviver com aquela gente e aquela
gente tem uma enorme paciência com ele, até
mesmo empatia: Giles acha que a implantação do
chip pode ter algum significado
importante diante da ordem das coisas, Willow
o salva de uma tentativa de suicídio, Xander o
abriga em sua casa/porão, Buffy faz o favor de
não matá-lo.
E assim
mesmo o malvado Spike trai a todos, se aliando
a Adam num plano maquiavélico.
O tempo
passa, e o vampiro, bem ou mal, continua a
conviver com Buffy e os Scoobies. Como
uma criança, ele começa a prestar atenção no
que este pessoal que luta a boa luta faz e sem
querer vai absorvendo muita coisa deles.
Quando se dá conta, está apaixonado pela
Caça-Vampiros, a quem devia odiar e matar.
Se para
Buffy e seus amigos o que Spike sente não é
real, para ele é, e ele passa a se comportar
de uma maneira que seja do agrado de sua amada
Buffy. Aos poucos, o vampiro cruel vai dando
lugar a um ser que começa a entender a
diferença entre o certo e o errado, que começa
a se preocupar com um outro ser que não ele
mesmo. Primeiro, é com Buffy que ele se
preocupa; depois, é com aqueles que Buffy se
preocupa e ama, como Dawn, principalmente, e
Joyce, mãe das duas garotas. Ele até mesmo
leva flores em homenagem a falecida Joyce,
pois gostava dela, se *importava* com ela,
porque ela o tratava bem.
Spike,
preocupado com o sofrimento de Dawn com a
perda da mãe, se oferece para ajudá-la no
feitiço para trazer Joyce de volta, e não quer
que Buffy saiba de nada, pois não está
interessado em ganhar pontos perante ela.
E não querer
apenas "fazer bonito" diante de Buffy só para
conseguir marcar pontos é mais uma vez
demonstrado quando o vampiro é sequestrado por
Glory e barbaramente torturado para falar quem
é a Chave. Spike não quer dizer que Dawn é a
Chave e está disposto a morrer pelo segredo —
e quase morre mesmo. Talvez se morresse,
poderia voltar como o fantasminha camarada e
cobrar de Buffy uma recompensa, por ter sido
tão valente e bonzinho...
Sua antiga
companheira e grande amor, a vampira Dru,
reaparece em sua vida e o convida a recordar
os velhos e bons tempos de crueldade e
matança. Recém-rejeitado por Buffy, ele aceita
a proposta e com ela é cúmplice da morte de um
casal no Bronze. Dru mata os jovens e Spike
bebe o sangue da garota morta. Mas logo ele se
dá conta que está cansado deste jogo e rompe
definitivamente com a ex-amante.
Para Buffy,
ele agradece por ela tratá-lo como "homem";
ele sabe que é um monstro, mas já tem dentro
de si a vontade de ser humano, como Buffy,
Dawn e seus amigos.
E ele prova
isto, quando, ao lado de Buffy e dos Scoobies,
ajuda na luta contra Glory, tentando manter a
promessa de proteger Dawn até o fim do mundo
"nem que o fim do mundo aconteça ser hoje."
Infelizmente,
Buffy tem que dar a vida para salvar sua irmã
e o mundo, e Spike chora a perda de sua amada
e seu fracasso em cumprir a promessa.
Buffy está
morta. O que se esperaria do vampiro Spike, a
criatura sem alma, agora que seu principal
interesse não existe mais? Juntar suas coisas
e se mandar. Por que haveria ele de querer
agüentar aqueles Scoobies chatos e a
irmãzinha chorona da Caça-Vampiros?
Contudo, ao
invés de ir embora, Spike fica, lutando a boa
luta ao lado de Willow, Xander, Giles e Tara,
e ainda bancando a babá para Dawn de vez em
quando. E certificando-se que a menina não vai
mais ser ferida, como foi com a perda da
irmã.
Enquanto
conta os dias sem Buffy, Spike patrulha com os
Scoobies, por livre e espontânea
vontade, sem nenhum interesse, até mesmo
construindo com Giles, por exemplo, uma
camaradagem comum aos amigos.
Quando
Sunnydale é atacada pelos demônios
motociclistas e a cidade está um caos, a
principal preocupação de Spike é proteger
Dawn. Ele a acalma, dando-lhe a segurança
necessária, como um pai faria com sua filha.
Quando vai pegar armas no baú para se
defenderem, esquece que é um vampiro e pega
numa cruz, queimando a mão.
Quando Buffy
volta da morte, Spike não pode estar mais
feliz, mas ao mesmo tempo se preocupa com as
conseqüências que o uso de magia negra pode
ter causado.
A ironia é
que, com a volta de Buffy, Spike é isolado
pelos Scoobies, principalmente por
Xander, que parece ficar incomodado com o
vampiro ainda estar "obcecado" pela
Caça-Vampiros. Talvez o fato de que Spike
tenha ficado 148 dias do lado certo da cerca
tenha provado algo que Xander faz questão de
não querer saber — o amor do vampiro pela
caçadora, afinal, é verdadeiro.
A própria
Buffy, confusa desde que foi ressuscitada,
isola Spike dos outros e o faz seu confidente,
contando a ele que estivera no Céu e não no
Inferno, como seus amigos pensavam. Ele é
carinhoso e atencioso com ela, além de
respeitoso — afinal, Buffy nunca dera nenhuma
abertura para ele, um vampiro sem alma.
O tempo
passa, e ele vê que suas chances com Buffy são
nulas. Por mais que todos digam que ele não
tem sentimentos, ele sofre por causa do amor
não correspondido. Então finalmente ele diz a
ela para deixá-lo em paz, que o deixe enterrar
seu amor num buraco bem fundo. Diz ainda que
Buffy "não precisa dizer nada." Mas ela, ao
invés de deixá-lo em paz, o beija
apaixonadamente, dando a Spike aquele fio de
esperança pelo qual o vampiro tanto sonhou e
até mesmo implorou um dia a ela que lhe desse.
Mais um
beijo e Spike agora sabe que a Caça-Vampiros
sente alguma coisa por ele, desejo, que seja.
Ele cobra dela os beijos, ela reage mal, ele
diz que um "homem" pode mudar — e ela joga na
cara dele que ele é uma "coisa ruim, nojenta e
sem alma."
Ao mesmo
tempo, ele descobre que seu chip não
funciona mais em Buffy. A sua primeira reação
é procurar um "Lanchinho Feliz Com Pernas" e
testar o chip. Afinal, Buffy e todos
outros insistem em dizer que ele é mau, então
deve ser verdade. Na hora de pegar a garota e
beber dela, Spike tem que convencer a si mesmo
que pode fazer isto, que é o que sempre fez,
que ele é um assassino.
Ele tenta
morder a garota, mas não consegue, o chip
está funcionando perfeitamente, o problema é
com Buffy. A pergunta que não quer calar:
teria ele matado aquela garota inocente? Se
tivesse, sentiria alguma coisa parecida com
remorso?
Bem, ele com
certeza poderia tentar matar sua terceira
Caça-Vampiros, mas não foi o que fez. Uma boa
briga com Buffy seria um bom modo de estar
próximo a ela e, inesperadamente, foi o que
ele acabou conseguindo, só que a iniciativa
foi da própria Caça-Vampiros e não dele.
A partir
daí, começa um relacionamento que só vai
deixar o vampiro confuso e deprimido, tirando
algumas boas horas de prazer na cama. Ele quer
conversar sobre a relação, ele quer saber o
que é aquilo que ele e Buffy estão tendo, ele
quer que ela seja sua garota, ele se magoa
quando ela diz que ele é "apenas conveniente",
quando ela se recusa a contar para seus amigos
que eles estão juntos, mas Buffy só quer sexo,
é a única maneira com que ela se comunica com
ele.
Completamente
sozinho e isolado das pessoas com quem passou
o verão defendendo Sunnydale, Spike se
contenta com as migalhas que Buffy lhe dá. Até
apanhar cruelmente dela ele apanha, talvez
porque ele sentisse que Buffy precisasse
daquilo, por não estar em seu estado normal.
No meio do
calvário da sexta temporada, entre outras
coisas ele salva Xander de ser morto por um
demônio (longe das vistas de Buffy, diga-se de
passagem), defende a posição de Willow em não
querer usar magia para que todos possam sair
da casa enfeitiçada de Buffy e sente uma ponta
de remorso quando nota que magoou a
Caça-Vampiros levando uma garota com ele ao
casamento de Xander e Anya.
Quanto ao
seu relacionamento com Buffy, depois de ser
pego com ovos de demônio escondidos em sua
cripta (roteiro escrito especialmente para
lembrar o quanto Spike é maaauuu), ela rompe
com ele. Ele fica arrasado, mas aceita a
situação, até que no casamento, Buffy diz a
ele que vê-lo com outra "machuca" e mais
tarde, depois de mandá-lo "seguir com a vida"
mais uma vez, ela parece ficar magoadíssima
por ele ter transado com Anya.
Seu estado
mental, a estas alturas, já está comprometido.
Ele quer ser um homem, mas todos insistem em
dizer que ele não é, é apenas uma coisa ruim
sem alma. "Deve ter *restado* algum mal em
mim, afinal de contas", diz ele a Dawn, depois
da garota contar que todos estão bravos com o
vampiro. Como sempre, seu refúgio é a bebida.
E é aqui que
as coisa rolam morro abaixo, que Spike perde o
controle de si mesmo e sai do caminho que tão
penosamente tentava se manter — sem muita
colaboração de Buffy e de seus amigos, diga-se
de passagem (ao contrário, todos eles pareciam
querer tirá-lo do bom caminho de propósito.)
Spike vai
até Buffy se desculpar por ter transado com
Anya — ele se *importa* com o que ela sente,
não quer vê-la sofrer. Mas Buffy, ao invés de
ser direta e firme, joga novamente aquela isca
para que o cachorrinho continue nas redondezas
e não vá procurar outro dono: "eu tenho
sentimentos por você, tenho sim." Então Spike
tenta quebrar a barreira entre os dois se
comunicando com ela do jeito que ela sempre se
comunicou com ele, através do contato físico.
Quando Buffy o joga para longe e ele se dá
conta do que estava fazendo, fica chocado.
De volta em
sua cripta, ele revê as cenas do banheiro em
sua cabeça e sente uma coisa que ele tem
dificuldade em entender o que é: remorsos. Ele
culpa o chip, diz que não pode ser nem
monstro nem homem, que não é nada. E então vai
embora, mas promete que vai voltar e que as
coisas serão diferentes.
Com certeza,
o vampiro que partiu de Sunnydale naquela
noite, não é o mesmo que chegou derrubando a
placa de boas vindas na entrada da cidade,
anos atrás. Não é o mesmo que andava com
Angelus e Darla e Dru, não é o mesmo que se
juntou a Adam, não é o mesmo que sequestrou o
médico da Iniciativa para que ele retirasse o
seu chip, não é o mesmo que matou a
dona da Magic Box.
O que eu
assisti foi a lenta e gradual transformação de
um ser *sem alma*, de cruel assassino sem
sentimento nenhum, em alguém que, ainda sem
alma, comete muitos erros, mas tem a
consciência que os cometeu, além de demonstrar
ter sentimentos, como amor e remorso.
Como disse o
Juiz, há muita humanidade em Spike. E agora
ele tem uma alma.
Gisele